terça-feira, maio 31, 2005

Regresso ao espelho

E um dia acenderei uma chama na mão.

Assim brilho por entre a sua luz
Para te medir o pulso às palavras,
Assim renasço no teu espelho
Para te fecundar a alma.

E um dia voltarei a ser teu.

Quase a sentir o meu coração a bater
Em cada página,
Quase a arrancar-te o alento do corpo
Com as minhas mãos queimadas.

E um dia… sempre noutro dia.

Serei só por uma vez aquele que te recebe
Agitada nas areias móveis de outras horas,
Para tomar a luz que te acendo na traqueia
E enforcar as minhas lágrimas nas tuas costas.

D.P.
Para a Cátia

domingo, maio 29, 2005

Ópera

acordo já demasiado tarde para ser inteiramente eu. às oito e meia lá espero que passes e logo pela manhã tenho os sonhos diluídos com o café e uma explosão de cores a rondar o sono. do lado esquerdo, a faca com a qual degolámos os sentidos e os versos que flutuam sobre a pele como a loucura flutua sobre os versos. passas sempre demasiado tarde para seres inteiramente tu. ao longo da fala há uma chama que se arrasta até à voz para lapidar o silêncio envernizado dos teus gritos demasiado melódicos, demasiado envernizados. vais para o conservatório, sempre para o conservatório de música embora vás demasiado tarde e eu tacteio uma ópera através de ti e através de ti já tudo foi escrito porque trazes as palavras agrafadas às sombras e é difícil explicar como consigo subir pelos teus sons ensanguentados e encontrar-me tão limpa e tão pura mesmo no fundo da cidade. caminhas como se nem te apercebesses que o fazes. e é através da manhã e do sono da manhã incandescente que os lugares se reflectem sem uma sucessão lógica e de olhos cerrados os lábios estendem-se aqui e ali a comandar a orquestra e na nota mais aguda do caminho a noite é adiada. escrevo ou escrevo-te por uma sedução opaca. as coisas deslizam para cima da navalha que define as formas clandestinas de deus.

S.C.

Que bom

Que bom! Tantas feiras do livro! ^_^

S.C.

quinta-feira, maio 05, 2005

Os autores

Elena Medel nasceu em Córdoba em 1985. Publicou em 2002 O meu primeiro bikini (Prémio Andaluzia Jovem 2001) e Férias em 2004. Traduzida em italiano e português, exerce crítica literária em diversos meios de comunicação e participa em antologias como A lógica de Orfeu. É uma das coordenadoras de actividades culturais d’A Bela Varsóvia.

Fruela Fernandéz nasceu em Langreo a 19 de Novembro de 1982. Colabora assiduamente com as revistas Clarín e Relógio de Areia. Actualmente estuda Tradução e Interpretação na Universidade de Salamanca. Publicou Círculos em 2000 com o qual obteve o prémio Astúrias Jovem 2000.


D.P.

quarta-feira, maio 04, 2005

A nova poesia espanhola

Ragazza

«Desculpe-me»
- sonho que o interrompo em plena rua - :
«O senhor leva o meu coração
pegado à sola do sapato.»
E, então,
descubro que também me envolve
o violeta doce e calmo dos seus olhos.

(Elena Medel)

As amigas

É preciso que voltes ao passado
E de novo percorras essas ruas
Calcetadas pelo silêncio.
É preciso
Que te encontres com elas, que recebas

As suas palavras de cal,
Que revivas as horas de cinza
Naquele parque onde não passaram
Tantas tardes fumadas às escondidas.

É preciso
Que estejam sempre ao teu lado,
Recordações de quem sempre volta só.

(Fruela Fernández)

Traduções de David Teles Pereira

D.P.

terça-feira, maio 03, 2005

Los señales

Mira sobre mis manos el dolor,
De la cera soldable, de la sangre,
Del amargo añoro, del acero entrante,
Donde quiera que esté no hay quien lo cambie.

Bebe en mi copa de ojos la cordura,
Del acerbo tajante, del irritante,
Del agua consumida, de la tontura,
Donde quiera que esté, no hay quien lo zanje.

Deidad de mis madrigueras,
Ojos de ónice, sobre mi herida
¿Por qué no veo que solo son molinos?
¿Por qué la verdad no me es elegida?

A por los dioses me dijo siempre el horizonte
Me lo dijo. Me lo sigue diciendo.
Pero lo que me señala tiene su fin
Y antes que llegue ya estaré muriendo.

Diego Alonso Villa
( in Del miedo y su estirpe)

D.P.