quarta-feira, março 16, 2005

Essencialmente Ferido

Actualmente, os Moonspell de Fernando Ribeiro são uma das bandas portuguesas mais reconhecidas no estrangeiro. Dentro do seu estilo, são quase de certa a que mais projecção internacional conseguiu até agora. O seu último álbum, embora longe de ser o meu preferido, conta com o apoio do livro de um dos mais notáveis autores portugueses da actualidade: José Luís Peixoto. Por estas e por outras tantas razões, esperava muito mais do novo livro de poemas de Fernando Ribeiro. No entanto, acabou por acontecer, não aquilo que eu esperava, mas aquilo que, logicamente, mais seria de esperar: uma poesia demasiado “Moonspell”.
Não quero com isto dizer que seja um livro mal escrito ou que seja um cômputo de banalidades, cansativo e repetitivo. O que quero dizer é que ao contrário do que eu esperava, Fernando Ribeiro direcciona a sua poesia exactamente para o mesmo público que ouve com agrado a sua música. Aquilo que lemos na grande maioria dos poemas é uma mera repetição de algo que já ouvimos em qualquer um dos álbuns da sua banda e, como tal, algo gasto. Pelo meio, há poemas de qualidade, há versos com imagens poderosas, mas As Feridas Essenciais, no seu todo, não conseguem surpreender, não nos permitem distinguir o Fernando Ribeiro poeta do Fernando Ribeiro vocalista. É um livro ferido na sua essência pela imagem que, exteriormente à poesia, rodeia o autor, o qual, com grande pena minha, não lhe soube fechar a porta antes de escrever. Como o disse, Feridas Essenciais não é um mau livro , não é um “bater no fundo”. É, contudo, um livro pouco surpreendente, pouco inovador e demasiado marcado pelos trabalhos artísticos paralelos de Fernando Ribeiro.


D.P.

segunda-feira, março 07, 2005

o som dos

o som dos espelhos
alaga as ruas
que se arrastam pelo corpo
entre o suor ácido das formas.
chove
e vejo a língua do relógio
misturar-se com a lama.
a cidade arde
e a minha ressaca
é uma lareira
a pingar pelos dedos.


S.C.

Uma tentativa de tradução

Como já era de esperar o filme Mar Adentro terminou a sua caminhada de consagração com a conquista do óscar ao melhor filme estrangeiro no passado dia 27 de Fevereiro. Já anteriormente coloquei neste blog o poema que inspirou o nome do filme. Desta vez deixo aqui a minha tentativa de tradução. Optei por dar mais atenção ao ritmo que entrar no rigor dos significados. Espero que agrade:

Mar adentro, Mar adentro
E na leveza do fundo
Onde os sonhos são como o vento
Juntam-se duas vontades
Para lhe medir o alento.

Um beijo acende a vida
Como um raio no céu cinzento
E numa metamorfose
No meu corpo eu já não me sento,
Sento-me no centro do universo.

O abraço mais infantil
E o mais puro dos beijos
Até sermos reduzidos
A um único desejo.

O teu olhar e o meu olhar
Como um eco martelando, sem palavras
Mais adentro, mais adentro
Até ao infinito do todo
Pelo corpo em que me invento.

Mas eu desperto sempre
E sempre quero seguir dentro
Para eternizar a minha boca
A beijar o teu cabelo lento

D.P.