Caixa de música
Esta noite
Vou vestir-me de prata,
Debruçar o meu olhar morto
Pela janela em que te apagas.
Sempre à noite
Sou toda e qualquer casa,
Que escondeu no seu refúgio
A minha última palavra.
Mas nesta e em qualquer noite
O meu beijo de mágoa
Será sempre o único alento
A vestir-te também de prata.
D.P.
Fecundidade dos espelhos
Hoje a terra pareceu-me silenciosa.
Pensei – ao abrir a gaveta do meu peito –
Que este era um bom dia para morrer.
Anotei com o pulso da alma
Todas as formas de sufocar em silêncio
E assinei num papel o toque bárbaro das suas feridas.
Mas talvez espere que a fecundidade dos espelhos
Me traga a mulher verde dos meus sonhos
Com dinheiro suficiente para comprar a morte em cada esquina.
Hoje encontrei uma deusa que me pareceu silenciosa.
Senti – ao anular a compra da minha morte –
Que amanhã também o meu espelho se venderia.
D.P.