sexta-feira, janeiro 07, 2005

W.G. Sebald

Sebald é o meu mais recente achado. Austerlitz, traduzido recentemente para o português, editado pela Teorema, é uma verdadeira viagem por lugares toldados. A descrição aparece-nos como se a Europa fosse uma longa avenida que uma personagem deambulante disseca, não só através do momento fugaz das impressões como também através da captação filtrada da realidade e que se traduz numa relação de conhecimentos com uma significação muito individual mas devidamente alicerçada. Há nestas narrativas uma invocação constante da memória como uma associação de sensações diferentes no tempo e no espaço mas que se interligam para se poderem ramificar nos vários aspectos da história de Austerlitz (não constituindo isso um paradoxo, pois a interligação e a ramificação ocorrem em momentos diferentes). O facto da densidade psicológica da personagem se misturar com a descrição dos espaços é algo que faz das delineações uma totalidade narrativa.
Mas não se julgue que esta é uma escrita melodramática ou excessivamente reflexiva. Tacteiam-se paisagens desoladas, mansões desabitadas há séculos, catedrais vazias. Ou seja, em Sebald a natureza é algo inóspito e os pensamentos são forrados por um pragmatismo doloroso.
No fundo, tacteia-se a ruína humana, como se a existência fosse apenas um final, mas um final corpóreo, simples.
De quando em quando podemos apreciar fotografias tiradas pelo próprio Sebald a partir de mapas e velhos manuais que procuram ilustrar o que é narrado. Umas com mais ligações directas do que outras, o que constitui um exercício de associação curioso.
As imagens interrompem as letras como um silêncio a erguer-se e a transpor o papel.

Escritor alemão, professor de literatura europeia na Universidade de East Anglia, em Norwich, foi o primeiro director do British Center for Library Translation.
Faleceu num acidente de viação, em Dezembro de 2001, aos 57 anos, no apogeu da sua produção literária.


S.C.